Procrusto: como quebrar padrões repetitivos?
- Ricardo Backes
- 28 de jul. de 2024
- 4 min de leitura

Os mitos podem nos mostrar atitudes, posturas e problemas diante da vida que são vividas por todos nós, por isso pode nos ajudar a elucidar diversos problemas, trazendo novas perspectivas valiosas. Hoje vamos focar no mito de Procrusto para falarmos sobre padrões rígidos ou repetitivos.
Procrusto é “o que fere ou mutila previamente suas vítimas”, Brandão nos conta a história dele:
“Procrusto, “aquele que estica ou reduz”, era um assaltante cruel que vivia na rota que ligava Mégara a Atenas. O criminoso assassino usava de uma técnica singular com suas vítimas: deitava-as em um dos dois leitos de ferro que possuía, cortando os pés dos que ultrapassavam a cama pequena ou distendia violentamente as pernas dos que não preenchiam o comprimento do leito maior. Teseu, o herói ateniense, o matou, aplicando-lhe suplício idêntico àquele que o bandido usava com suas vítimas” (Brandão, J. S; p. 537)
Mas você pode estar se perguntando: o que isso tem a ver com padrões?
A resposta é: tudo!
Possuímos um jeito tendencioso de ver o mundo, agir e reagir diante das situações, fazemos o mesmo que Procrusto: esticamos ou reduzimos o mundo, as emoções, os sentimentos, pensamentos, percepções de acordo com o nosso leito de ferro. Somos violentos com o que não couber lá, esticando ou reduzindo isso. Jung chamou esse “jeito tendencioso” de atitude.
“Entendemos a atitude como uma disposição da psique de agir ou reagir em certa direção” (Jung, §768); essa disposição pode ser consciente ou inconsciente, ela cria um padrão. Entenda que o padrão é necessário e natural, pois construímos um jeito de agir diante da vida porque isso nos é exigido.
O grande problema é quando temos um exagero, ou seja, ficamos preso dentro da nossa própria disposição, é quando o que te dava liberdade se torna uma prisão.
É quando você se torna como Procrusto.
O padrão (disposição/atitude) é construído pela combinação de fatores psicológicos e da sua história, por isso é tentador dizer que é possível quebrar tal padrão, mas precisamos pensar sobre o custo de quebrar aquilo que demoramos tanto para construir, e mais ainda: o que será construído no lugar disso?
Contraditoriamente, querer quebrar o padrão te faz agir como Procrusto, pois você só irá desejar quebrar aquilo que não encaixar no seu leito de ferro.
Do mesmo jeito que o cachorro não consegue pegar o próprio rabo, você se verá incapaz de quebrar os próprios padrões sozinho.
Selecionamos e atribuímos valor as coisas a todo momento, acontece que as coisas que você excluir facilmente como inválidas podem ser as coisas que você mais precisa, e você nem perceberá que jogou algo fora, só vai perceber que sua vida está estagnada e ficará confuso sobre como, onde e porque isso aconteceu.
Quando você tentar quebrar seus padrões, você agirá através dos seus padrões.
É como tentar eliminar a água estando mergulhado no oceano! Não há como sair de si mesmo, não há como sair da água sozinho e simplesmente olhar sobre si mesmo, sobre o que pensa, sente, age e reage de um modo isento, você estará sempre cheio de si mesmo! É impossível separar essas coisas por completo.
Procrusto é a perfeita representação desse processo. Por exemplo: imagine que um sentimento lhe surge a mente, logo você irá colocá-lo no leito de ferro, você vai distorcê-lo para algo que seja aceitável sentir. Como um assaltante violento, você irá esticar, cortar, mutilar o próprio sentimento para que ele se adeque de acordo com as suas expectativas, sua atitude, sua seletividade.
Você percebe como isso tudo é delicado?
A Psicologia Analítica Junguiana se propôs a olhar isso e reconhecer que sempre estaremos imersos na nossa “mente” ou melhor, psique. Não podemos sair de nossa própria mente e mudá-la de fora.
Você quase sempre vai selecionar as coisas do modo como sempre fez, a mudança não é impossível, mas ela é delicada, complexa, tal qual seria um labirinto, ou seja, você facilmente se perde, desiste e acha que é impossível.
Se você reconhece essa limitação então percebe que é necessário uma ampliação, ou seja, uma atitude ou expectativa mais flexível que possa admitir novos fatos, que não são tão novos assim, mas que você nunca se permitiu experienciar.
É praticamente impossível dizer o que a mudança vai exigir de você, e cabe a cada um decidir se vale a pena continuar repetindo o mesmo ciclo, ou se vale a pena tentar quebrar esses padrões e construir algo mais amplo e menos sufocante.
Não há uma escolha menos digna, cada um deve saber onde o próprio sapato aperta, o que é uma prisão ou o que é liberdade para si próprio. Você pode até permitir que alguém responda isso por você, mas uma coisa é impossível de escapar: as consequências das próprias escolhas que tornam-se o seu destino.
Nossa capacidade de escolha é proporcional ao quanto somos conscientes de nossos padrões.
Agora, como quebramos esses padrões? Infelizmente não consigo responder isso sem nem conhecer você, talvez seja isso algo muito feliz, porque se eu tivesse tal resposta eu estaria colocando o ser humano em um dos leitos de ferro, cortando ou esticando-os para que coubessem em minha resposta incrível. Por mais tentador que isso possa ser (ter uma resposta), é preciso admitir as minhas limitações.
Só você pode responder o “como” você poderia quebrar seus padrões, mas não é só você, é o que habita dentro de você, são todas as coisas que você esticou ou cortou para que coubessem nas suas expectativas. Só a escuta desse material todo, seu confronto consigo mesmo podem trazer as questões mais essenciais e críticas sobre a sua vida.
Para isto serve a análise, ao cliente como um todo, até mesmo as partes que você exclui da vida.
Esse material se manifesta nos sonhos, nas perturbações, nas ansiedades, na culpa, na raiva e dentre tantas infinitas coisas que consideramos um incômodo.
A Psicologia Analítica Junguiana desenvolveu diversas ferramentas que quando bem aplicadas podem possibilitar ao paciente ampliar sua consciência, e se possível e conveniente quebrar padrões ou flexibilizá-los para tornar a vida mais inteira adicionando ou enriquecendo-a com aquilo que foi descartado.
Caso seja sua escolha e se esse caminho faz sentido para você, clique aqui e agende sua primeira sessão.
Ricardo Sergio Backes Bertuol
Psicólogo CRP 08/32882
Referências:
Brandão, J. S. Dicionário mítico-etimológico. Petrópolis: Editora Vozes, 2014.
Jung, C. G. Tipos Psicológicos. Petrópolis: Editoria Vozes, 2013.
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